17/05/08

Gaudì - Rainer Zerbst - Taschen

Gaudi arquitecto Catalão, deixou uma obra ímpar no campo da arquitectura.
Arquitecto inovador, colocava a sua racionalidade entre a fantasia e a realidade. Tornou-se num mestre ao conceber soluções arquitectónicas fora da matriz clássica e fora dos conceitos convencionais que sugeriam limites à arte de construir em meio urbano.
Gaudi foi único. Tinha um estilo muito próprio de projectar, fortemente influenciado pela natureza. Quer tivesse nascido Catalão, Japonês, Norte-americano ou Brasileiro, aquele génio criativo destacar-se-ia com as suas concepções em qualquer parte do mundo. E é de qualquer parte do mundo que afluem a Barcelona, pessoas para ver as obras que deixou pelas ruas da cidade.
Influenciado pelas transformações e inovações da revolução industrial, Gaudi foi um multifacetado artista, entusiasmando-se com a pintura e sobretudo com o mobiliário urbano metálico.
Penso que Barcelona deve muito a Gaudi. Como o próprio dizia, Barcelona na época era parca em monumentos e este convicto das suas idealizações ergueu no início do século XX edifícios imorredoiros. Mesmo nos dias de hoje ainda me surpreendem. E se reparamos, os actuais ex-libris de Barcelona são as construções de Gaudi.
Este livrinho da Taschen, tem no início uma pequena nota biográfica sobre o artista e uma compilação com 16 das suas principais obras, desde a Casa Vicens até à Sagrada Família, passando pelos interiores da Catedral de Maiorca. Não vou falar sobre a sua obra arquitectónica. Nem vou falar sobre o seu edifício mais badalado e polémico – A Sagrada Família. Polémico pela sua religiosidade, mas sobretudo, a meu ver, pela ausência de um plano ou projecto técnico para o ter levado a bom porto num curto prazo, encontrando-se ainda inacabado com implicações na utilização do interior. Note-se que as fachadas são uma das componentes de um edifício sendo o interior outra.
Das suas obras vou destacar uma das mais importantes – A Casa Milà. A Casa Milà foi concebida para albergar a família Milà. Deduz-se à partida que será um edifício de apartamentos. É, e não é, em simultâneo. A Casa Milà ou a Pedreira como é conhecida, é um edifício solto, livre de quaisquer utilizações pré-definidas. Essa liberdade é tanto visual com funcional. Os alçados formam um gaveto. Embora pareçam dicotómicos eles são como um só. Ao olhar para o gaveto, tomo-o apenas como um alçado, num plano único por onde flui o ondular dos balcões dos pisos, lembrando um oceano de ondas de pedra. Da cobertura, reconhecemos um volume ondulatório propositadamente criado para um contínuo das fachadas. As chaminés serão talvez o primeiro contacto visual que nos surge, sugerindo o que se quiser: monstrengos, personagens armados, dadas a várias interpretações. O sótão deixou de ser sótão. Passou a ser espaço útil, habitável, utilizável, abandonando a concepção que o condenava ao eterno armazém de velharias. No terraço, a geometria comanda, e daí podemos contemplar a arquitectura de uma perspectiva que a integra na urbe, como também se pode admirar a arte de Gaudi nos seus mais ínfimos pormenores. Cada vista é uma vista. Nunca é igual à que a precede.
Um à parte: repare-se que Gaudi não queria guardas-corpos no terraço, pois seriam depreciativos para a natureza robusta da obra. No interior, tal como no exterior, predominam as formas ondulantes, parabólicas, não lineares. Cada piso de 1600m2, divide-se em quatro partes de 400m2 cada. Ao repararmos, corredores, paredes, janelas e até os mais pequenos acessórios como maçanetas, patenteiam sob todas as perspectivas o movimento. É surreal, compartimentos desenharem formas não convencionais, mas o objectivo era mesmo esse. E nesses mesmos compartimentos de paredes curvilíneas os móveis convencionais não fazem sentido. Um banco corrido rectangular seria inútil, tanto pela estética como pela funcionalidade. Os ornamentos não ficaram de lado e seguem fielmente a mesma orgânica do grosso construtivo. No núcleo da construção, comuns às partes, existem dois pátios para fruição de luz e de ar, por onde penetra o sol e a claridade. De um dos pátios eleva-se uma bela escadaria metálica em espiral. Para além do original, da orgânica e dos materiais naturais, a singularidade que dou mais importância tem a ver com a versatilidade do edifício. É notável que Gaudi tenha no início do séc: XX, dotado uma construção com toda a liberdade construtiva e funcional. A Casa Milà pode a qualquer altura acolher um hotel, ou serviços. As paredes, os panos de divisórias, não estão lá para além de serem uma envolvente desprendida de uma estrutura base. Estas paredes poderão ser removidas e reedificadas de acordo com as pretensões de novas utilizações. Imaginem um edifício onde se encontravam apartamentos, passados 6 meses tem no mesmo piso ou pisos, um hotel instalado! Genial e talentoso, para a altura.
A Gaudi foi-lhe dada liberdade, liberdade essa consignada em contrato com os Milà. Esta orgânica arrojada e ambiciosa que fervia no arquitecto feriu os propósitos da família Milà, tendo havido uma tentativa gorada, por parte dos proprietários, em cortar os restantes honorários.
A Casa Milà afigura-se como um marco. Marco de uma loucura de um génio, que veio abrir novas portas e apontar novos caminhos para o design arquitectónico e para que o aproveitamento de espaços fosse visto de forma diferente.
A par, as técnicas construtivas Catalãs também foram anunciadas ao mundo numa altura onde não abundava a riqueza, passando pelo reaproveitamento dos materiais existentes.
Salvador Dali, um dos seus amigos, foi um dos primeiros a visitar a Casa Milà. E feliz ficou numa das fotos, com uma das inconfundíveis chaminés em pano de fundo.

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