O Nariz - Nikolai Gógol
O mais conhecido livrinho do ucraniano Nikolai Gógol - contemporâneo de Puskine - dos seus 5 títulos da colecção Gato Maltês da Assírio & Alvim, tem como protagonista um nariz. É verdade. O nariz como apêndice físico, mas sobretudo como se nele estivesse concentrado o “ego” do indivíduo, a sua importância social e até profissional.
Convirá portanto, ao seu portador, a sua preservação, e de preferência nas melhores condições possíveis. Ou até no caso masculino, ornamentada com um lustroso e bem cuidado bigode. Desta forma, na medida de uma grande metáfora, “O Nariz”, apresenta todos os contornos de uma crítica burlesca à sociedade russa de S. Petersburgo, onde o escritor em meados do séc. XIX, aflora os vícios e costumes dos Peterburgenses.
O sentido de humor de Gógol misturado com a sua fantasia, estão bem patentes nesta obra, tornando-a numa caricatura literária bastante interessante e desafiadora até, tendo-me por vezes provocado algumas gargalhadas pela fértil imaginação com que nos é apresentada. A historieta versa sobre um estranho fenómeno que sucede numa manhã de um dia friorento. O nariz não se encontrava entre as bochechas do seu dono, o jovem major Kovaliov. Homem orgulhoso do seu aspecto, ao mirar-se em frente ao espelho, passa a mão no local da cara onde habitualmente costuma estar o nariz, e nada! Estava raso. Desaparecera. O dito nariz, ao longo do conto, aparece-nos ao sabor da imaginação do escritor. Ora surge na face de alguém de alta patente, não passando cartão nem ao próprio dono; ora segundo diziam os rumores, se julga estar noutros locais na posse de outros intervenientes. Digamos que se passeia por Petersburgo envergando melhores ou piores roupagens. Vai subindo ou descendo de categoria. No entanto, o apêndice é o mesmo de sempre. É inconfundível.
Estes episódios fazem-me lembrar um verso do nosso poeta do povo, António Aleixo:
Uma mosca sem importância
Convirá portanto, ao seu portador, a sua preservação, e de preferência nas melhores condições possíveis. Ou até no caso masculino, ornamentada com um lustroso e bem cuidado bigode. Desta forma, na medida de uma grande metáfora, “O Nariz”, apresenta todos os contornos de uma crítica burlesca à sociedade russa de S. Petersburgo, onde o escritor em meados do séc. XIX, aflora os vícios e costumes dos Peterburgenses.
O sentido de humor de Gógol misturado com a sua fantasia, estão bem patentes nesta obra, tornando-a numa caricatura literária bastante interessante e desafiadora até, tendo-me por vezes provocado algumas gargalhadas pela fértil imaginação com que nos é apresentada. A historieta versa sobre um estranho fenómeno que sucede numa manhã de um dia friorento. O nariz não se encontrava entre as bochechas do seu dono, o jovem major Kovaliov. Homem orgulhoso do seu aspecto, ao mirar-se em frente ao espelho, passa a mão no local da cara onde habitualmente costuma estar o nariz, e nada! Estava raso. Desaparecera. O dito nariz, ao longo do conto, aparece-nos ao sabor da imaginação do escritor. Ora surge na face de alguém de alta patente, não passando cartão nem ao próprio dono; ora segundo diziam os rumores, se julga estar noutros locais na posse de outros intervenientes. Digamos que se passeia por Petersburgo envergando melhores ou piores roupagens. Vai subindo ou descendo de categoria. No entanto, o apêndice é o mesmo de sempre. É inconfundível.
Estes episódios fazem-me lembrar um verso do nosso poeta do povo, António Aleixo:
Uma mosca sem importância
poisa com a mesma alegria,
na careca de um doutor,
como em qualquer porcaria...
Com esta perda, o major Kovaliov desespera. E é nestas circunstâncias que nós leitores, quando este enceta uma tentativa de resgate do nariz pela polícia e pelos jornais, somos levados a conhecer toda a máquina burocrática do funcionalismo estatal da cidade. Os diálogos travados entre o major e os funcionários e a sua caricata busca pelo nariz, iluminam o retrato que é feito a muitos quadrantes da sociedade de S. Petersburgo.
Um aspecto particular da escrita de Gógol, e que muito apreciei à semelhança de outro grande escritor português, foram as construções das personagens intervenientes, e dos ambientes onde decorre a narração. É notória a semelhança das descrições das roupagens envergadas, o seu aspecto circunstancial, fazendo recordar o Eça de Queiroz que lançava sempre um olhar pormenorizado aos personagens e respectivos adornos como os bigodes, o estado de humor, as casacas e demais acessórios. Gógol faz o mesmo tipo de descrição, dando também ênfase às expressões faciais, às vestes com as insígnias de cada classe, e às suas cores. Poderá parecer insignificante a referência a este aspecto, contudo, considerando os usos e costumes da época, tais referências são bastante importantes pois catalogam as personagens, colocando-as no estrato social ao qual pertenciam.
Numa outra obra de Gógol, “O Capote”, a exploração dessa caracterização é elevada a um nível pouco usual. No entanto, é neste aspecto que o escritor Ucraniano se distingue. Gógol provém de famílias nobres. Ainda jovem, no início da carreira muda-se para Petersburgo, tornando-se num conhecedor da cidade, das suas virtudes e sobretudo dos seus defeitos, colocando a descoberto nas suas rocambolescas obras, os ridículos tiques, os preconceitos, os códigos e convenções de todo um leque de personagens, resultantes das profundas diferenças entre estratos sociais. Numa linguagem simples e inteligente, o autor estende essa sátira a todas as histórias desta colecção: “O Nariz”, “A Avenida Névski”, “O Capote”, “O Retrato” e “O Diário de Um Louco”. Curiosidades comuns a estas obras são as constantes referências ao nariz, ou sob a forma cómica, pois os russos têm sobre este muitas piadas, ou lembrando a utilidade da saliência física que tanto jeito dava para se enfiar na caixa do rapé. A par, o escritor tem especial predilecção pelo desgraçado funcionário vitimado pela sociedade, colocando sempre um a protagonizar as suas bizarras novelas. Como se pode adivinhar, recomenda-se na sequência deste “O Nariz”, a leitura dos 3 seguintes títulos da colecção. O “Diário de um Louco”, trilhando o mesmo caminho das anteriores obras que nos levam a percorrer o real e o fantástico, faz uma abordagem aos delírios e psicoses do indivíduo, podendo por isso afastar alguns apetites literários, mantendo contudo, os semelhantes propósitos de crítica social. Todavia, é um conjunto de livros que são peças do mesmo projecto que Nikolai Gógol arquitectou, como retrato de uma sociedade cujos defeitos lhe eram familiares, e com a força da sua escrita, mesmo que sui generis, os denunciou.
Com esta perda, o major Kovaliov desespera. E é nestas circunstâncias que nós leitores, quando este enceta uma tentativa de resgate do nariz pela polícia e pelos jornais, somos levados a conhecer toda a máquina burocrática do funcionalismo estatal da cidade. Os diálogos travados entre o major e os funcionários e a sua caricata busca pelo nariz, iluminam o retrato que é feito a muitos quadrantes da sociedade de S. Petersburgo.
Um aspecto particular da escrita de Gógol, e que muito apreciei à semelhança de outro grande escritor português, foram as construções das personagens intervenientes, e dos ambientes onde decorre a narração. É notória a semelhança das descrições das roupagens envergadas, o seu aspecto circunstancial, fazendo recordar o Eça de Queiroz que lançava sempre um olhar pormenorizado aos personagens e respectivos adornos como os bigodes, o estado de humor, as casacas e demais acessórios. Gógol faz o mesmo tipo de descrição, dando também ênfase às expressões faciais, às vestes com as insígnias de cada classe, e às suas cores. Poderá parecer insignificante a referência a este aspecto, contudo, considerando os usos e costumes da época, tais referências são bastante importantes pois catalogam as personagens, colocando-as no estrato social ao qual pertenciam.
Numa outra obra de Gógol, “O Capote”, a exploração dessa caracterização é elevada a um nível pouco usual. No entanto, é neste aspecto que o escritor Ucraniano se distingue. Gógol provém de famílias nobres. Ainda jovem, no início da carreira muda-se para Petersburgo, tornando-se num conhecedor da cidade, das suas virtudes e sobretudo dos seus defeitos, colocando a descoberto nas suas rocambolescas obras, os ridículos tiques, os preconceitos, os códigos e convenções de todo um leque de personagens, resultantes das profundas diferenças entre estratos sociais. Numa linguagem simples e inteligente, o autor estende essa sátira a todas as histórias desta colecção: “O Nariz”, “A Avenida Névski”, “O Capote”, “O Retrato” e “O Diário de Um Louco”. Curiosidades comuns a estas obras são as constantes referências ao nariz, ou sob a forma cómica, pois os russos têm sobre este muitas piadas, ou lembrando a utilidade da saliência física que tanto jeito dava para se enfiar na caixa do rapé. A par, o escritor tem especial predilecção pelo desgraçado funcionário vitimado pela sociedade, colocando sempre um a protagonizar as suas bizarras novelas. Como se pode adivinhar, recomenda-se na sequência deste “O Nariz”, a leitura dos 3 seguintes títulos da colecção. O “Diário de um Louco”, trilhando o mesmo caminho das anteriores obras que nos levam a percorrer o real e o fantástico, faz uma abordagem aos delírios e psicoses do indivíduo, podendo por isso afastar alguns apetites literários, mantendo contudo, os semelhantes propósitos de crítica social. Todavia, é um conjunto de livros que são peças do mesmo projecto que Nikolai Gógol arquitectou, como retrato de uma sociedade cujos defeitos lhe eram familiares, e com a força da sua escrita, mesmo que sui generis, os denunciou.
Estes contos estão agora reunidos no livro Contos de São Ptersburgo da Biblioteca Editores Independentes [classif:18/20]
5 comentários:
Viva Victor.
Nunca li nada de Gogol mas é daqueles escritores que há muito andam nas minhas listas, sobretudo porque o homem pertence aos clássicos.
Obviamente que o "Nariz" está no topo dessa lista.
Parece-me de facto um escritor muito interessante, até porque descurtino semelhanças com Eça e faz caricaturas à sua sociedade, algo que me apraz muito ler.
Um abraço
Nuno
Já gora,
andas de vento em poupa no que respeito a leituras.
:D
é um belissimo livro.
Tens que os ler. Agora estão reunidos num livro só - Contos de São Petersburgo, e apenas por 3.60€, na FNAC, claro.
Um abraço e aparece.
Victor
Concordo.
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