16/08/07

O Pequeno Herói

O Pequeno Herói de Fédor Mikhailovitch Dostoievski, foi escrito no presídio de Sampetersburgo, quando este foi sujeito à solitária. As suspeitas de participar em reuniões conspirativas junto de activistas democráticos e socialistas, inspiradas em correntes exteriores, levaram-no, pelas mãos do Czar, à prisão e posterior condenação à pena máxima de morte. Todavia, à última hora, a pena foi retirada e substituída por nove anos em árduos trabalhos na temida região da Sibéria.
Publicado em 1859, O Pequeno Herói encerra em si, nas escassas 60 páginas, o pilar que Dostoievski encontrou para a sustentação moral durante aquele período angustiante e solitário de reclusão.

Ao acompanhar o enredo do romance, acabamos por fazer uma análise à vida de um pequeno rapaz, que na idade de 11 anos sente os instintos próprios provocarem-lhe as naturais e confusas reacções de atracção e paixão pelo sexo feminino. Apesar da candura dos seus sentimentos e de algum pudor, estas incursões no mistério da tentação e do prazer encontram sempre campos lodosos, que para os principiantes podem resultar numa exploração sofrida e silenciosa por quem o rodeia e nele exerce atracção e domínio. A saber : exemplares do feminino moscovita e burguês da altura, que em ócio e enfado viviam. Apesar de tudo, tendo apenas a travesseira da sua cama como única confessora, o pequeno homem acaba por conseguir ultrapassar alguns dos seus maiores receios graças às ganas irreflectidas, próprias da sua idade. O título dado ao livro justifica-se aqui.
O estilo da escrita de Dostoievski conserva a essência patente noutras obras - Crime e Castigo, por exemplo -, bem como os seus fervores internos que geram o móbil para os seus textos, como a preocupação da exposição das dúvidas e da angústia humana, colocados de forma assustadoramente real para despertar quem lê. Denota também o drama subjacente, próprio de uma obsessão em querer expor os defeitos da sociedade: a falta de valores, a futilidade, as aparências e outras doenças de que padece o "pequeno lixo social". Porém, resigna-se, porque sabe que "a humanidade não existiria sem a inveja e a calúnia".
Na nota introdutória do tradutor da edição publicada na Europa-América, que durante estes dias quentes vai à estampa integrada numa colecção do D.N., vem uma pequena síntese acerca da obra o autor com a qual concordo: "A leitura meditada da sua obra torna possível a íntima compreensão de todas as ulteriores transformações da consciência e da sensibilidade universais".
Mesmo com uma ponta final ensossa que contraria o ritmo vivo da restante narrativa, pareceu-me um livro que colhe pela análise daquele pequeno e singelo ser, em contraste com a complexidade adulta que o rodeia, pois recordou-me e envergonhou-me de algumas das minhas hesitações púberes (não ter lido o livro uns anos antes...), e como refere novamente o tradutor, serviu de tábua ao escritor, qual Camões no Índico, enquanto a sua mente era corroída no cativeiro pela incontornável certeza que a morte se aproximava. Classif.:[15/20]

1 comentário:

Anónimo disse...

um blog muito útil.
boas festas!