A Dama de Espadas
Alexandre Puskine foi contemporâneo de Nikolai Gógol, do qual li O Nariz, O Capote, Avenida Névski, O Retrato e O Diário de Um Louco, pertencentes à colecção Gato Maltês da Assírio & Alvim. Penso que são ambos escritores da mesma cepa, muito pelos seus retratos do clima social russo da época, em especial o urbano das cidades de Moscovo e São Petersburgo.
Nas suas novelas predomina o personagem masculino, fogoso e venturoso, que corteja a singela e elegante Dama. A máquina burocrática estatal, é também alvo das narrativas, que em Gógol atinge o auge em O Nariz e O Capote. Puskine, que sofreu as influências ideológicas e de estilo na ligação que manteve com Gógol, criou com a sua peça teatral O Inspector Geral, uma outra caricatura do funcionário público russo, entretanto designada também por fábula fiscal. Temos, portanto, a sátira como objectivo primordial destes dois autores, que têm o mérito de, por um lado, ter criado um estilo que caracterizou a literatura russa do início do séc.XIX, e por outro, de representar e de cristalizar uma Rússia mal conhecida na época, afastada do crepitar ocidental europeu e que até nós chegou por estas páginas.
Quanto a esta história novelesca de A Dama de Espadas, que saiu hoje na colecção Livros de Bolso DN, encontramos o enredo dramático, habitual nos romancistas daquela época.
A resenha do livro encontra-se na contra-capa, e fala da condessa Ana Fédotovna que nos tempos da sua juventude era considerada a Vénus Moscovita. Em Paris até Richelieu lhe fez a corte, contudo sem sucesso. Na mesma cidade com a sua beleza mortífera ganhou fama, mas também perdeu uma fortuna em dinheiro, que só à custa de um truque de jogo revelado por um amigo, foi recuperada. A história anda em torno da tentativa de revelação do misterioso truque por um sequioso e sedutor jovem militar.
As fatalidades, as damas de companhia, as tramas premeditadas e as ilações consequentes, são elementos constantes e imprescindíveis nestas novelas, embora aqui surjam os jogos de cartas de mesa, onde a paixão pelo jogo, a fortuna e a gula contida e cavalheiresca são os princípes das noites. Noites essas que se alongavam em animados serões, na companhia dos mais variados personagens e nos melhores salões da Rússia imperial, que constituem um quadro agradável de imaginar ao longo da leitura. Gostei da seguinte deixa, que saiu da boca da velha condessa Fédotovna. Cito de cabeça: "...romances russos, isso existe? Tens de me trazer um!"
Puskine, faz um excelente trabalho de representação da vida social moscovita sua contemporânea, com enfoque nas classes mais nobres - a nobreza decadente e a burguesia ascendente. Este retrato, a meu ver, vai além de uma visão generalista dessas esferas de topo, ao expor, sob o ponto de vista social como do íntimo, o "modus vivendi" da mulher russa pertencente a uma "alta roda" que valorizava mais o parecer do que o ser.
Classif.:[15/20]
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